Orlando nasceu na Ilha dos Açores, em Portugal, mas vive no Brasil – em Curitiba – desde 1963. É formado em direito, mas sempre se dedicou ao mundo da fotografia. Participou de diversas exposições individuais e coletivas e lançou vários livros. Seu livro mais recente “Paranaguá, Lagamar”, da série “Expedição Coração do Brasil”, foi lançado em 2012. Suas imagens podem ser encontradas em vários acervos nacionais e internacionais, como o International Center of Photography de Nova York, Museu Frances de Fotografia em Paris, MASP, MAM-SP e Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro entre outros. Um dos seus feitos que mais se orgulha foi ter criado o Museu de Fotografia Cidade de Curitiba, o primeiro do gênero na América o Sul.
1. No seu website você se define entre coisas, como especialista em expedições, o que é na sua visão, um especialista em expedições?
Todo e qualquer projeto e ato de fotografar implica para mim na visceralidade de uma expedição metafísica. Expedicionário é o que busca revelar e descobrir. No meu caso fiz da Expedição Coração do Brasil um projeto de vida onde se somam já mais de 90.000km rodados em todo o território nacional em veículo 4×4. Claro que para empreender uma expedição é necessário muito estudo e planejamento. Há uma listagem imensa de pequenos e essenciais detalhes que se somam a roteiros e pautas. Todos os meus projetos são de longa duração e exigem, sim, muita fé e determinação. Muita crença para tornar realidade o sonho. Expedição visa transcender em seu empreender. Somar e aprender. Saber ler a pátria da emoção.
2. Como foi a descoberta da fotografia autoral?
Desde muito criança que a imagem exerce um grande fascínio em meu íntimo. Retratos de pessoas e sua saga, paisagens do grande mistério da vida são e estão sempre presentes em minha obra. Gosto do estado de perturbação e da sensação de inquietação. Assim é minha marca e minha cicatriz. Na fotografia sou vários e percorro diversos universos e temas. Mas há sempre uma textura que é meu estado de loucura e meu estado de espírito. Devo inclusive começar a assinar com pseudónimos que irão corresponder aos diversos signos e ciclos de meu trabalho. Acima de tudo busco me encontrar no ato de realizar. Quando vejo um bom trabalho há sempre uma grande alegria onde se assume a cumplicidade desta grande babilônia em que se converteu e perverteu a fotografia. O uso abusivo do que chamam de fotografia como suporte, discursos e conceitos, curadores e acadêmicos na grande tertúlia do entretenimento cultural.
3. O que você busca na sua fotografia? Qual assunto te atrai mais?
Busco meu encontro e me descobrir, mesmo que saiba que é pura utopia. Mas a fotografia me dá o grande prazer da liberdade e ser convocado pela imagem. A fotografia é extremamente generosa. Ela se oferece o tempo todo, basta ter a mente aberta como uma janela infinita. A fotografia vem para você e o que fotografa é que você é. É um atestado de seu interior e formação. Certamente que me atrai sempre o olhar do outro no qual o retrato é implacável. Um retrato é sempre um autorretrato e a prova de verdade. Um bom retrato não mente jamais.
4. Como é o seu processo de criação? Desde a captura de imagens até a edição final.
Não acredito em inspiração, mas em transpiração, intuição e inquietação. Fotografo muito e sempre. Um constante desafio e exercício. Claro que desde o momento mágico de captar o movimento do momento até a edição final há sempre um longo e árduo processo. A edição final é sempre extenuante. Cada vez mais quero começar a convocar amigos em quem confio para selecionarem comigo meu material o que é essencial para sua isenção.
5. Como você escolhe seus projetos?
Ministro um workshop em raras e restritas ocasiões chamado “Fotografia em Transe” e, entre outras questões que são abordadas falo de projetos. Sempre deixo bem claro que o projeto deve escolher cada um. Não adianta nada ser um garimpeiro de projetos e concursos. O projeto tem que estar dentro de você. Os projetos me escolhem e vão se somando em meu roteiro de inquietação e construção.
6. Pelas informações do seu website, concluí que seu projeto mais significativo foi a “Expedição Coração do Brasil”, como surgiu esse projeto?
Sempre tive a alimentei o desejo de percorrer as artérias do Brasil para melhor compreendê-lo. Este país continente da grande diáspora da língua portuguesa onde a mestiçagem é sua grande paisagem. Em 1994 iniciei o esboço deste projeto e empreitada junto com o alpinista Valdemar Niclevicz que logo em seguida é o primeiro brasileiro a atingir o monte Everest e eu assumo o cargo de Diretor de Artes Visuais da Fundação Cultural de Curitiba que consumiu 4 anos de realizações. Retomei o projeto em 1999 e são já cinco livros publicados, num projeto de vida e absolutamente interminável.
7. Foi um projeto bastante longo, como você gerenciou a ansiedade/expectativa de finalizar o projeto no tempo certo?
É como disse um projeto interminável. O primeiro ciclo no qual percorri literalmente o Brasil do Chui ao Oiapoque durou 3 anos e foram percorridos 70.000 km em 4×4 e geralmente por estradas secundárias, intermináveis milhas fluviais. Foram lançados três livros (Homem, Terra e Mito) numa coleção já esgotada. Vendi dois carros para segurar o projeto embora tenha tido várias importantes participações tais como a Kodak Professional, Boticário, Coleman e no final a Petrobrás.
8. Você participou da criação do “Museu de Fotografia Cidade de Curitiba”, como foi seu envolvimento nesse projeto?
Concebi e idealizei o projeto do Museu de Fotografia Cidade de Curitiba quando fui Diretor de Artes Visuais da Fundação Cultural de Curitiba e como resultado das Bienais Internacionais de Fotografia também por mim criadas e com um pensamento muito claro em relação à fotografia produzida no Brasil. O Museu foi resultado de um valioso acervo que foi se constituindo através de aquisições e doações na Mostra Brasil das Bienais. São quase 2.000 obras onde se incluem coleções muito valiosas e raras. Mas as Bienais sucumbiram vítimas da incompetência e desdém público. Hoje o Museu está longe de ser um instrumento de referência, sem gerência e sem critérios e, com graves ocorrências e danos em seu patrimônio.
9. Você tem varias obras expostas em diversos acervos no Brasil e no exterior, o que esse reconhecimento traz pra você?
Os melhores resultados sempre obtive fora do país e muitas delas em situações únicas. Claro que é gratificante saber que sua obra integra coleções privadas e museus. Numa profissão tão complexa e difícil como a de realizar projetos pessoais em fotografia ver suas imagens reconhecidas é vital.
10. Quais projetos você tem em andamento?
Estou saindo no final do mês para produzir para um livro sobre a cidade do Rio Grande no RS contratado por uma editora carioca, a Barléu (Francisco Alves). O texto será de Eduardo Bueno o que muito me estimula. Não consegui obter patrocínio para meu novo projeto Expedição Coração do Brasil – Santa Catarina através da Lei Rouanet o que é sempre muito complexo e difícil. Mas já me acostumei e como taurino/leonino não desisto. O último que foi Expedição Coração do Brasil-Lagamar, foram 4 anos, 3 anos para fechar patrocínios e um ano navegando e produzindo.
11. E o que você pode falar sobre seus projetos futuros?
Projetos e desejos são muitos. Quero dar continuidade ao Gaúcho da Fronteira, a População Indígena, Roraima, Serra da Capivara, etc e etc. Cada vez mais me volto para meu casulo de ilhéu açoriano. Lagamar nasceu dessa saga onde nessa região a presença açoriana é muito forte e rica assim como o próximo de Santa Catarina. Por outro lado aguardo resultado de proposta para fotografar o arquipélago dos Açores tão longínquos e desconhecidos no Brasil.
12. Qual projeto seria a realização de um sonho?
Como disse o poeta maior Fernando Pessoa “O homem sonha, a obra nasce”. Com o tempo e sua passagem surgem questionamentos e somos invadidos por pensamentos. Nem tudo na vida é fotografar. Aliás sempre digo que a melhor foto é aquela que não fiz e guardo na alma e no olhar. Com o tempo os sonhos viram pássaros e fantasmas, se desfazem e se perdem no grande labirinto do mistério.
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Poucos são os fotógrafos que sabem falar sobre a sua obra como o Orlando Azevedo. Com lucidez, clarividência e simplicidade.
Um forte abraço destes longínquos Açores.